domingo, 27 de março de 2016

Nunca mais ouvi Taylor Swift de manhã

Quando comecei a falar sobre você, achei que de alguma forma desvendaria todas as narrativas que escrevi sobre nós dois e que, deliberadamente, escondi em várias gavetas da memória. Achei que poderia reunir, em um lugar só, cada diálogo, cada lembrança, cada expressão sua.

Mais do que seguir o conselho que sempre dou ao Carlos, de não lembrar só das partes boas, no fundo, o que eu esperava era encontrar a prova irrefutável de que não havia nada para lembrar. O que descobri, no entanto, foi que você virou uma história sem periodicidade, que aparece no meu passado e continua reaparecendo no futuro. Sinto que o despi de toda individualidade. E que talvez não tenha sobrado nada seu no você que eu conto aqui. Desculpa?

Outro dia, estava lendo um livro da Nora Ephron e achei a seguinte passagem:
Ele me ensinou a cozinhar cogumelos e que se você aquecer bem a manteiga e colocar apenas alguns cogumelos na frigideira, eles ficam gostosos e marrons e crocantes, enquanto que se a manteiga estiver apenas moderadamente quente e você encher a frigideira de cogumelos, eles ficarão murchos e úmidos. Toda vez que preparo cogumelos, penso nele. Houve outro homem na minha vida, quando eu era mais jovem, que me ensinou a colocar coalhada nos ovos mexidos, e já que eu jamais coloquei coalhada nos meus ovos mexidos, eu nunca penso nele.

Fiquei rindo na cama e lembrei do dia em que mandei uma mensagem para o João. Eu dizia que, toda vez que olhava o emoji de coelho, me lembrava dele. Automaticamente, percebi que não costumava usar muito esse emoji. Apesar de amá-lo, gostava de usá-lo somente em ocasiões especiais, pois algo dentro de mim sabia que me traria lembranças.

No mesmo momento, pensei em você. Mas você não tem um emoji. Você tem toda uma playlist de música pop. A culpa não é minha de ter que voltar aqui para falar sobre isso mais uma vez, sabe? A culpa é desse sucesso que a Taylor Swift ainda faz.

Depois que você parou de me procurar, tive que escolher uma nova música para as minhas manhãs. E a cada nova pessoa que me aparece, mais músicas tenho que descobrir. Talvez, o que me deixe mais triste não seja exatamente não conseguir ouvir Blank Space ao acordar. E, sim, lembrar-me do que sentia quando a ouvia durante todas aquelas manhãs em que me senti apaixonada por você.

Talvez o que me deixe triste mesmo seja não poder mais ter a ilusão de que uma música do Justin Bieber me faria contar as horas para sair do trabalho e me jogar nos braços do rapaz que eu conheci no carnaval.

– O que aconteceu com aquele cara que você tava saindo? — Fernanda me perguntou quando nos encontramos no último fim de semana.

– Ah, não te falei dele, né? — Fitei a mesa de plástico do bar com cara de cansada e fiquei me perguntando se valia a pena repetir esse tipo de história  — Mas já era.

Sabe, o triste é saber que a lembrança do sentimento se cola nas coisas. Mas eu, bom, eu ainda me sinto desgarrada de tudo.

As portas do elevador se abrem e eu dou um último sorriso para ele. A gente se fala! Entro no elevador e me olho no espelho. Não sei o que tem nos espelhos de elevador. Sempre me pergunto se é a iluminação. Mas, hoje, eu sei que é cansaço e uma desesperança que só aumenta. Enquanto os números no letreiro luminoso vão diminuindo, fico apalpando, no bolso, todos os brincos que deixei cair na cama e que ele acaba de me devolver. Essa pele tá horrível, me censuro e fico pensando no quanto devo parecer patética com tantos cravos no nariz.


Fonte: Jenny Yu

3 comentários:

Escritor disse...

Seane, teus posts são escritos "atualmente"?

secoelho disse...

Oi, Escritor

Eu tenho textos velhos, que ficam guardados por um tempo e, eventualmente, acabam sendo publicados. A série Se eu tiver que falar de você é um pouco velha. É de dezembro/janeiro. Era uma história com começo meio e fim. E agora deixou de ser. Não sei se isso já responde. Mas, sobre esse texto em particular, ele foi escrito atualmente sim.

Anônimo disse...

Olá senhorita Seane, tudo bem?
Sabe, me parece que ainda vai haver uma reviravolta nessa história aí. Esse cara some e aparece no estilo "Mestre dos Magos", não sei não... Parece que você tá reservando algo, tem uma carta na manga... hehehe
Pelo seu estilo, vejo que esta não é uma história de conto de fadas com um "felizes para sempre" no final, mas de alguma maneira, creio que ainda ficarão juntos. É como se ele terminasse relacionamento, estivesse feliz com a atual, porém de alguma forma ainda tivesse uma conexão com a ex, ainda que não se falassem mais ou trocassem emojis. Sei lá, é meio complicado de explicar, mas às vezes acontece comigo. rsrs

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