Talvez você tenha estranhado o título dessa postagem. Talvez
você simplesmente não tenha entendido e começou a ler apenas para se certificar
de que é mais um texto dramático por mim. Não, este não é um texto literário e
não pretende ser ficção (ainda que nada não possa não o ser).
Há algum tempo, a questão das distâncias e das alterações das
noções de espaço me fez iniciar algumas reflexões. Nada importante ou profundo,
aviso. Na época, eu me perguntava sobre uma suposta necessidade de pulverizar ou
negar espaços físicos que antes estavam fixados por relacionamentos pessoais.
Eu explico. Sabe aquele garoto por quem você foi apaixonada que te levou para
comer um doce em um restaurante japonês específico? Ou aquela lanchonete que
você e seu ex-namorado frequentavam?
Naquela ocasião, a única coisa que
consegui pensar a partir dessas perguntas era que, apesar de parecerem muito instáveis, os nossos relacionamentos
pessoais (não necessariamente amorosos) conseguiam nos fixar e nos dar muito
mais certezas que lugares físicos estáveis. Como? Produzindo sentido.
Hoje, pensando sobre um conceito de não-lugar, que, para
Augé, seria o padrão desse nosso espaço redefinido, descobri que o amor é um lugar. Sem querer me
estender sobre um conceito teórico, vamos apenas pensar o não-lugar como o
lugar da circulação. É o aeroporto, as vias, o ônibus, o caixa de autoatendimento,
etc. O não-lugar é o espaço onde você não é o que é, não existe identidade no
movimento. Você se identifica apenas para embarcar. Na circulação, não se
estabelece história.
A questão é: o não-lugar não se restringe àqueles exemplos
diretamente relacionados com transporte. O não-lugar é qualquer lugar,
dependendo da perspectiva.
E onde entra o amor? Se nós concordarmos que atualmente
passamos grande parte da nossa vida transitando (porque essa é a concretude do
espaço, afinal) e nos estabelecendo apenas temporariamente em não-lugares, cabe
perguntar quais espaços são esses em que escrevemos nossa história e nossa
identidade.
O próprio pensador que concebeu o não-lugar adverte que não
existe um não-lugar absoluto. Existe algo que sobrevive ao trânsito. E eu gosto
de acreditar que é o amor. Que são nossos pais (não apenas pelo parentesco),
nossos amigos e nossos relacionamentos amorosos. São eles que estipulam distâncias
e tempos. Somente em relação a algo nos identificamos. E essas relações podem
ser tão fugazes quanto uma viagem, mas existe algo nelas que nos marcam de
outra forma. São essas relações que conseguem transformar o exemplo perfeito do
não-lugar, o virtual, em um lugar sólido e familiar.
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