terça-feira, 31 de dezembro de 2013

O que foi dito

Eu não sabia por que tinha aceitado, mas ali estava. Te amo foi usado cem vezes, a primeira vez logo após eu ter dito oi. Perdão foi dito cento e vinte. Mas trinta vezes fora de contexto. O nome dela foi usado quarenta e seis vezes. Seis vezes em vão. “Por quê?” foi dito pelo menos dez vezes, todas por mim. Não sei foi usado cinco vezes. Sexo foi usado sete vezes por você. Eu disse apenas uma vez. Você disse amizade vinte vezes e amigos, cinco. Eu disse confiança três vezes e traição mais oito, em gritos, choramingos e sussurros. Eu disse acabou três vezes. E janeiro também. Você disse não três vezes.

Eu disse facebook e whatsapp uma vez cada. Você disse memória e celular uma vez. Eu disse férias duas vezes. Você disse fica dez vezes. Eu disse estudar apenas uma vez e, em seguida, disse enganada. Você disse desculpa mais trinta vezes. Você disse praia e surf dez vezes. Você também disse O hobbit duas vezes.


Futuro foi usado três vezes. Relacionamento aberto foi dito sete vezes, assim como regras. Beijo foi usado oito vezes antes de você me segurar e me beijar. Abraço não foi dito por mais que nós permanecêssemos juntinhos. Decisão também não foi usado, nem voltar. Esqueci de usar terminar. Zarolha foi usado mais cinco vezes. E alguém contou uma piada sem graça. Provavelmente você. Nós rimos. Casa foi dito pela segunda vez, então. E eu disse comigo pela primeira vez. Entramos no carro. Feliz Natal foi dito uma vez por cada um de nós.

Mais tarde, repetimos. 


domingo, 22 de dezembro de 2013

Insegurança

Nocaute. Eu estou no chão de novo. Não sei como aconteceu, mas foi como sempre foi. Nada mudou. Levanto e te falo que nada se resolve assim. Vamos conversar. Ainda dá para virar o jogo. Sinto que preciso ganhar.

Já passei por isso. Já passei. Deve existir a solução que eu nunca tentei. É um aliado diferente. É um adversário igual.

Sinto a mão gelada do chão no meu rosto. Sou eu, embaixo de novo. E, enquanto a cabeça roda, imagino porque achei que poderia ganhar dessa vez. Por que seria diferente? Porque haveria vitória na batalha que eu sempre perco?

Eu não tinha treinado o suficiente para encarar você. Achei que sim. Achei, amor. Mas eu baixo a guarda e você me destrói mais um pouco.

É isso. Não existe sincronia nessa dança. Erramos os passos, mas só meus pés são pisados.

Nocaute. Não sei se levanto. Ou vou embora.

Você acaba? Ou eu acabo antes que se acabe?


quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Anexo ao Guia do Sexo Verbal: Sobre a pepecância ou jebificação

Quando este Guia primeiramente começou a ser construído em 2012, nosso intuito era notadamente o de mostrar ao leitor que existia bastante diferença entre "quero te chupar”, “quero chupar tua buceta e me lambuzar” e “quero fazer oral na tua perereca”. Não queríamos ser autoritários, mas acreditávamos que a segunda opção era a que mais umedecia, ainda que todas pudessem ser usadas em contextos apropriados. 

O Guia foi de grande ajuda para milhares de leitores. Homens nos escreveram contando que antes do Guia tinham receio de encarar a buceta no dirty talk. Enquanto nossas leitoras demonstraram alívio frente à nossa posição completamente hostil à rola (Rola continua não rolando, gente).

Mas o Guia não pode mais se furtar às recentes manifestações de caráter sexual que tomaram de conta do meio digital. Ela chegou com a onda do fenômeno zueira (cujo estudo ainda exige pesquisas acadêmicas mais aprofundadas) e, nada silenciosamente, penetrou nossa intimidade. Irmã mais nova e ainda não tão foneticamente rebuscada da nossa conhecida perereca , a pepeca (pepeka ou ppk) já convida o nosso imaginário a pensar em sapeca. No equivalente masculino, anteriormente, poderíamos tentar mesmo igualar a função da pepeca, no vocabulário sexual, ao da piroca amiga. No entanto, seu desenvolvimento e proliferação na internet gerou um fenômeno completamente novo que quase destruiu o Guia do Sexo Verbal: a pepecância ou jebificação.

Pepecância é o nome dado ao fenômeno de implantação da ironia na conversa sexual. É a safadeza em cima do muro, sem classificação indicativa.

Eu vou comer a tua ppk até me cansar” – A pepeca permite que se tenha menos cautela na hora de saber o que falar. Pode ser uma brincadeira (Claro que eu tava brincando! Olha só como eu escrevi...), pode ser um convite caliente. Depende se colar.

Eu quero é ppk!!!” – A pepeca permitiu uma aparente liberação da manifestação de desejos sexuais. Você quer sexo, umas metelas, umas chupadelas? Pode tudo! Contanto que seja com a pepeca (ou seus companheiros de zueira).

Que ppk linda *.*” – A pepeca é lindinha e gostosa. A buceta é só gostosa. Pepeca conversa, sente saudades e sai do banho cheirosinha. Buceta fica molhada.

Meus amigos gostam é de jebas” – A pepeca danadinha também abriu a caixa de pandora dos nomes esdrúxulos para o sexo oposto. Pintas (sim, isso mesmo!) e jebas estão oficialmente liberadas para a sacanagem! (Mas rola NÃO! Nem pensem nisso).

A pepecância ou jebificação do sexo verbal não é tudo. É apenas parte de uma grande diversificação do humor e das formas de se expressar, que torna difícil a tarefar de recomendar nomes e verbos (Mamar não, gente. E vai dar estocadas em outro lugar!). Mas, sobretudo, se olharmos o fenômeno no contexto apenas do sexo falado podemos observar como se opera um processo de mascaramento do tabu. É possível falar da depilação e da cor dela, do que se quer fazer com ela e do que se quer que seja feito com ela, com a condição de que...ERA BRINCADEIRA, GENTE!

Portanto, nós, do Guia do Sexo Verbal, defendemos que ainda não podemos deixar a buceta na mão. Ela começou a sacanagem e ela leva isso a sério. E é ela que, juntamente com o pau, mantém a fronteira entre o que pode ser falado no ouvido e o que pode ser postado no twitter.

Ps.: Tem alguma dúvida? Pode enviar para a gente via comentários! :)




terça-feira, 5 de novembro de 2013

Àqueles que não merecem meu amor

Quando você disse que não merecia meu amor, apenas virei para o lado e sorri com desdém. 

Naquele momento, eu queria ter perguntado: você acha que o meu amor vale mais?

***

Vale mais que o Oscar, o Nobel, o dinheiro e todos os prêmios que voce fantasiou um dia ganhar? 
Vale mais que o sucesso, o reconhecimento ou a riqueza que todos desejam para si mais ou menos secretamente? 
Vale mais que a família tradicional, a esposa bonita, os filhos talentosos e o bom emprego que você queria encontrar no seu futuro? 
Ou mais que as viagens a realizar e o grande conhecimento que você queria possuir? 
Vale mais que toda a felicidade que você aprendeu a desejar desde que teve idade para pensar no futuro? 
Vale mais que todas essas coisas que você intimamente acha que merece?

Não se faça de rogado. Não diga que não merece nada. Você acha que merece tudo isso apenas por ser a pessoa boa, que você mais profundamente que qualquer outro sabe que é. (Afinal, todo mundo é bom na sua própria perspectiva. Por que no nosso mundo conseguimos justificar qualquer ação ruim que um dia possamos ter feito). 
Vamos... Você é melhor que muita gente! Vai dizer que nunca pensou isso?
E agora? 
Ainda acha que esse amor, que você acha que conhece, é algo tão longe do seu merecimento? 
É superior até mesmo à felicidade?
Não, né?

***

Mas, após de um minuto de pensamento, eu apenas resumi. Com outras palavras, exclamei que não existia covardia maior que culpar uma suposta superioridade do outro:

- Então vai se fuder!

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O erro

– Ele é que devia ser um louco! – Ele disse sem acreditar na história que ela acabara de contar.
– Você acha mesmo? – Ela perguntou insegura, mas se sentindo já um pouco melhor por dentro. – Estou me martirizando há tanto tempo por isso.
– Você realmente acha que errou?
– Não e Sim. Talvez eu devesse ter imaginado... que estava mandando todos os sinais errados...
– Não é bem assim, vamos. Relaxa, ele é que deve ser louco.

Ela sorriu. Começou a gostar dele. Há muito tempo não encontrava alguém que conseguisse tirar o peso das suas costas.

Beijaram-se.

Ela sorriu. Tinha esperanças que ele fosse a resposta para tudo e a solução para os seus problemas. O fim dos dias de remorso.

Transaram.

– Tem certeza que ainda não me acha louca? – tentou parecer irônica.
– Não. – Ele sorriu e deu um beijo no braço esquerdo dela, que ainda repousava ao seu lado na cama.

Você pode falar isso pra ele?


quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Sofrimento não vale


Oi, Juninho. Aqui é a vovó. A vovó tá aqui, bebê. Desculpa só ter chegado agora. Lembra que eu disse que não podia faltar o trabalho? Desculpa, meu filho. Eu não sabia que não ia mais te ver. Juninho, tá tudo bem com você agora? Você parou de sentir dor? Papai do céu tá cuidando de você? Meu filhinho, tenho certeza que você vai ficar bem. A vovó é que não sabe como vai ficar sem você aqui. A vovó te ama tanto, meu filho. Ela nem acredita que você...

Ai, Juninho, sabe por que a vovó tá querendo conversar com você? Porque ela precisa que você entenda, meu filho, que ela te ama. Todo mundo aqui te ama. Tua mãe não sabe o que fazer. E o teu irmão não sabe o que aconteceu, mas não para de perguntar por você. Juninho, você só tinha dois anos, Meu Deus! Já vivi muito nessa vida, criei tua mãe e teu tio com um salário mínimo. E depois acolhi a vizinha lá em casa junto com a filhinha dela. E depois veio o teu irmão e depois você, Júnior. A gente é pobre demais, meu filho. Mas a nossa família sempre se virou. Eu não sei por que você, logo você, meu bebê, teve que...

Juninho, a vovó te ama. Não esquece disso, tá? Talvez a gente não tenha como te enterrar, mas a gente te ama. Meu filho, eles tão pedindo 3 mil reais pra te enterrar. Mas, Júnior, se a gente tivesse esse dinheiro, talvez você estivesse aqui...  E não dá pra fingir que vamos conseguir pagar isso em mil parcelas. A gente precisa de cada centavo do meu salário, meu filho. Tem o teu irmão, tua mãe, teu tio e a tua vó que já tá ficando velha, meu filho. Todo mundo diz que tempo é dinheiro, Juninho. Mas acho que só tempo mesmo. Porque o sofrimento da tua vó, meu filho, não vale nada.  Júnior, não sei se você tá entendendo. Júnior, nós vamos deixar teu corpinho aqui. Júnior, a gente te ama...


Mas a gente não pode te enterrar. 

terça-feira, 10 de setembro de 2013

O amor é meu lugar

Talvez você tenha estranhado o título dessa postagem. Talvez você simplesmente não tenha entendido e começou a ler apenas para se certificar de que é mais um texto dramático por mim. Não, este não é um texto literário e não pretende ser ficção (ainda que nada não possa não o ser).

Há algum tempo, a questão das distâncias e das alterações das noções de espaço me fez iniciar algumas reflexões. Nada importante ou profundo, aviso. Na época, eu me perguntava sobre uma suposta necessidade de pulverizar ou negar espaços físicos que antes estavam fixados por relacionamentos pessoais. Eu explico. Sabe aquele garoto por quem você foi apaixonada que te levou para comer um doce em um restaurante japonês específico? Ou aquela lanchonete que você e seu ex-namorado frequentavam?

Naquela ocasião, a única coisa que consegui pensar a partir dessas perguntas era que, apesar de parecerem muito instáveis, os nossos relacionamentos pessoais (não necessariamente amorosos) conseguiam nos fixar e nos dar muito mais certezas que lugares físicos estáveis. Como? Produzindo sentido.

Hoje, pensando sobre um conceito de não-lugar, que, para Augé, seria o padrão desse nosso espaço redefinido, descobri que o amor é um lugar. Sem querer me estender sobre um conceito teórico, vamos apenas pensar o não-lugar como o lugar da circulação. É o aeroporto, as vias, o ônibus, o caixa de autoatendimento, etc. O não-lugar é o espaço onde você não é o que é, não existe identidade no movimento. Você se identifica apenas para embarcar. Na circulação, não se estabelece história.

A questão é: o não-lugar não se restringe àqueles exemplos diretamente relacionados com transporte. O não-lugar é qualquer lugar, dependendo da perspectiva.

E onde entra o amor? Se nós concordarmos que atualmente passamos grande parte da nossa vida transitando (porque essa é a concretude do espaço, afinal) e nos estabelecendo apenas temporariamente em não-lugares, cabe perguntar quais espaços são esses em que escrevemos nossa história e nossa identidade.
O próprio pensador que concebeu o não-lugar adverte que não existe um não-lugar absoluto. Existe algo que sobrevive ao trânsito. E eu gosto de acreditar que é o amor. Que são nossos pais (não apenas pelo parentesco), nossos amigos e nossos relacionamentos amorosos. São eles que estipulam distâncias e tempos. Somente em relação a algo nos identificamos. E essas relações podem ser tão fugazes quanto uma viagem, mas existe algo nelas que nos marcam de outra forma. São essas relações que conseguem transformar o exemplo perfeito do não-lugar, o virtual, em um lugar sólido e familiar.

Talvez isso nos ajude a entender melhor por que o fim ou a ausência de um relacionamento almejado, nos deixe tão desnorteados. Como se apenas passeássemos por espaços, sem conseguirmos nos fixar. Sem termos a impressão de estar construindo algo. Muitas vezes, nos sentindo também incompletos. Às vezes podemos supervalorizar o relacionamento amoroso (principalmente). Acreditar que ele pode completar tudo que acreditamos incompleto é um erro. Mas, sem dúvida, ele é um ponto de contato entre uma individualidade e outra. É um ponto de referência, um espaço e um tempo. Quando em uma vídeo-conferência, dois rostos cansados se encontram para terminar o dia com boa noite’s.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Você não vai encontrar o amor da sua vida

Nesses últimos tempos, uma questão tem sido reincidente aqui nos meus botões. Tudo começou com uma conversa simples com um grande amigo. Eu tinha acabado de contar que acreditava ter encontrado o homem da minha vida quando ele riu e me falou que tudo é aleatório

Queria eu que ele tivesse dito a mesma coisa para a garota que eu fui dos 13 aos 20 anos. Ela não teria discutido, porque discutir dessa forma não faz parte de um perfil passivo-agressivo. Mas teria soltado umas risadinhas nervosas e acenado em negativa mentalmente. Como assim as pessoas que passam pela nossa vida são aleatórias? Como assim não existe alguém que foi exclusivamente feito para ficar comigo e ser feliz ao meu lado (e somente assim)? 

 Apesar de ter tido a constatação de que o “único” ou a “alma gêmea” não passava de uma ilusão após o fim de um relacionamento cheio de “eu te amo de verdade”, só percebi o quanto aquela crença ainda tinha um papel nas minhas escolhas quando ouvi a teoria do meu amigo. 

Se você olhar para trás, consegue ver também aquele relacionamento que não te oferecia nada mas que você insistia em manter pois acreditava ter uma conexão especial com a outra pessoa? Consegue imaginar quantas pessoas você vestiu com a ficção do “homem da minha vida”? 

Às vezes parece muito triste admitir que, não, não existe ninguém que você necessariamente vai encontrar na sua vida. Mas nós temos que aceitar o risco de admitir essa incerteza. Admitir, por exemplo, que talvez o seu atual parceiro não tivesse se aproximado de você se você não tivesse vestido a camisa da banda que ele gosta no dia em que se conheceram. Ou se você não tivesse feito a brincadeira certa na hora certa. 

Parece horrível admitir que seus amigos e seus amores não teriam tido a conexão que têm hoje com você se não fosse um momento. Totalmente aleatório. Essa ideia teria matado de ansiedade a garota que eu era. Ansiedade por medo de perder todos os momentos que colocaram as pessoas que eu amo no meu caminho. Porém, agora percebo que, mais aterrorizante que isso, é acreditar em únicos. Pois eles pressupõem uma eternidade, um amor gratuito, mas não prevêem esforço. Então digamos que você começasse um namoro com alguém que só podia ser o seu “único”. Quão triste não seria perder a única pessoa que estava destinada a você em toda a sua vida porque vocês simplesmente não souberam conduzir um relacionamento? 

A aleatoriedade nos dá uma chance de recomeçar sempre. E, melhor, de nos esforçarmos cada vez mais para aproveitar cada oportunidade que nós mesmos criamos. Tudo poderia ter dado errado no dia que você conheceu a maior parte das pessoas que faz parte da sua vida, mas deu certo! Nós fazemos funcionar daqui para frente.


terça-feira, 30 de julho de 2013

A felicidade dos outros



Não tive medo de ser incompleta, de ser quebrada, de ser ferida. Não tive medo de jogar no ventilador meus ciúmes, minhas dores e mesquinharias. Não tive medo de ser triste em meio a um mundo de gatinhos e balões coloridos jpeg. E nem vergonha de dizer que minha tristeza era das pequenas.

Era mais fácil ser menor, vazia e solitária. Que explicar para o mundo que era fácil demais estar feliz ao teu lado. Se houve luta, foi ensaiada. Se houve poesia, foi menor que um haicai. Não houve dúvida, nunca houve clímax e o único erro, se houve, foi o da minha vergonha de acreditar.

Tive vergonha de trocar a liberdade de ser triste pelo sacrifício de ser feliz. Tive vergonha de te chamar de amor. Mas antes que pudesse calar, todos já tinham ouvido. Tive vergonha de confessar: que você me fez querer tudo que era miúdo e lugar-comum e que eu sempre achei que não combinava com a cor dos meus olhos. Eu quis o brincar de falar de filhos futuros, com nomes péssimos. Desejei anéis de compromissos, aulas de massagens, viagens para Porto de Galinhas, alimentação saudável, direção sem álcool e dividir despesas. Eu ri das tuas piores piadas só porque eu já estava no meio caminho com o sorriso bobo que você me deu de presente.

Ainda tive vergonha de que você me fizesse mais uma, me fizesse normal e me fizesse tédio. Desculpa, eu não sabia que eu já era clichê. No entanto, quando, uma vez mais, senti tua mão na minha, parei de temer. Que parte do meu mundo se apagasse. 

Pois os capítulos dessa história que eu escrevi sozinha estavam todos errados. 

Vamos ter que refazer.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Escritora de romance pornográfico




Sonhava em escrever um
Romance pornográfico
Respeitável.

Que encharcasse garotas
e fizesse paus duros
baterem palmas em barrigas flácidas.
Palmas de puro gozo
Literário.

Começou
ligando pro Paulo
e oferecendo um boquete
bem dado.

Por que primeiro,
se vira puta
para então
escrever sacanagem.

Isso é,
Se você for mulher.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Relacionamento estável


– Ela simplesmente enjoou de mim...
– Ele jurava que me amava...

Ficaram em silêncio e olharam para o horizonte enquanto suas mãos se procuravam. Tocaram-se.

– Promete que não vai enjoar de mim?
– Nunca. Ela era louca.
– Eu te amo.
– Me ama de verdade? Pra sempre?
– Sim.

Fitaram-se por um segundo e voltaram a olhar para o horizonte. Apertaram as mãos uma última vez e as separaram. Arrependeram-se.

Finalmente entendiam a tolice das promessas.


quarta-feira, 3 de julho de 2013

Uma explicação didática sobre o amor


Marcela e Maurício caminhavam silenciosamente pela calçada. Chegaram ao bar e escolheram uma mesa. Marcela preferia sentar no local mais esquecido, mas Maurício queria fumar. Escolheram uma das mesas da calçada. O vento não estava gelado e a temperatura estava amena, porém Marcela não pareceu perceber e permaneceu de casaco. 

Maurício acendeu um cigarro. As outras mesas do bar ainda estavam vazias.

– Então, o que tu tava querendo me contar? – ele perguntou liberando a sua primeira leva de fumaça.
– Bom, é um pouco complicado... Mas vou tentar explicar com uma analogia.

Ele sorriu, ela respirou fundo.

– Vamos supor que nós vivemos em alto mar. Estamos em uma região tão profunda em que não é possível tocar o pé na areia, apenas estamos na água e acreditamos que existe o fundo do mar, a areia.
– Certo.
– A água é a realidade. A areia é o real.
– Não sei se entendi. Por que tu tá diferenciando a realidade do real?
– Porque é a água que dá forma ao mar, que aqui é o mundo. – Como Maurício continuava calado, ela tentou melhorar. – Estou supondo que a realidade está acima do real. Sempre estamos em contato com a realidade, mas nunca em contato com o real. Apenas acreditamos que a realidade o reflete, seja por meio de crenças ou de experiências empíricas. Mas não sabemos até que ponto a água é uma forma honesta da areia. E eu, pessoalmente, acredito que apenas em alguns momentos, a realidade deixa entrever os pontos em que o real se impõe com mais força, no caso da morte, por exemplo.
– Então nunca acessamos o real, por isso a analogia com o alto mar, em que estamos sempre em contato apenas com água...
– Exato! Aqui eu chamei a realidade de água. Mas tem muita gente que defende que a realidade são os discursos que nos ajudam a compreender o real.
– Acho que entendi. Onde tu quer chegar?
– Em mim. Eu, Marcela, sou uma mulher, branca, classe média, entre os vinte anos, que existe.
– Ok. Concordo que tu existe – ele se divertia.
– Isso quer dizer que eu faço parte da realidade e... do real. Todas as características que eu te dei fazem parte da realidade discursiva. Já a minha existência faz parte do real.

A cerveja deles chegou e Maurício encheu os copos.

– Hmm... Prossiga.
– Daí eu chego em ti.

Ele levantou a sobrancelha direita.

– Tu também existe e está nesse mar comigo. Tu também ocupa o real e a realidade. Antes, eu acreditava que os nossos afetos estavam diluídos na água, que só poderiam ser sentidos quando fossem compreendidos por um discurso que os classificasse e diferenciasse. Mas, você, Maurício, você existe na areia e na água. E você me puxou para baixo. Você me fez tocar a areia. Você quebrou uma dimensão, furou a rede.
– Como eu fiz isso?
– Existindo!
– Ainda não entendi.
– Eu te amo. – Ela disse e bebeu o primeiro gole de cerveja.



quarta-feira, 26 de junho de 2013

Seguimos adiante mais uma vez


“E o mundo seguiu adiante...” foi o título que eu escolhi quase por acaso para batizar meu blog em 2007. E ao longo desses quase seis anos de sua existência, nunca me arrependi. Hoje, a estreia do novo layout, só reforça a ideia poderosa por trás da frase. O mundo segue, tudo segue, nós seguimos. Seguimos querendo fazer melhor e morrendo de vergonha de ser tão próximo e tão íntimo. Os textos deste blog são fruto das inquietações e meditações de Secoelho. Uma mulher muito parecida comigo, só que um pouco pior e mais brega.

A ilustração linda (!) que agora é a cara do blog foi um presente do mais que querido Dellano Oliveira – uma das pessoas mais talentosas que eu conheço, com quem eu tive a oportunidade de trabalhar por alguns meses.

Pensei em várias ilustrações ou formas de fazer a nossa “cara” seguir adiante e a ilustração do coelho foi a que mais me deixou feliz. Essa é a tatuagem que eu sempre quis e nunca fiz. Escolhi-a para ser eterna na minha pele. Nessa pele virtual que é tão minha e, às vezes, mais exposta que a outra.

***

Corpo limpo

O espelho me diz que
Eu não tenho piercings
Ou tatuagens
Ou lambs
Ou grafites.
Sou careta.

Meu corpo limpo
É uma grande piada interna
De quem não se acha
Mas adora ser
Careta.

Meu corpo limpo
Está limpo há 24 anos
Sem arte de rua
Só arquitetura

Se meu corpo
Fosse uma cidade
Não seria São Paulo.

Em comum,
Só partilhamos a piada interna
De se achar transgressora
Mas viver
Careta.

Em comum,
Nada de terrorismo,
Só poesia.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...