domingo, 29 de julho de 2012

A dor da minha geração


Um dia jogaram na minha cara: tu gostas de sofrer. Eu não. Nós. Minha geração. 

No começo achavam que nós éramos apenas românticos. Uma geração emocionalmente idealista que surgiu em meio a uma exposição ao sexo e violência constante, que chamavam de realidade. Estavam enganados. Não éramos a geração do amor. Éramos a geração do amor eterno, incondicional, impossível. Não importava a felicidade, não importava um momento feliz. Importava a intensidade, importava a dificuldade, a luta, a busca incansável. E, em todas elas, importava a dor. Minha geração achava que o ultra-romantismo era legal e que o realismo só podia ter o dedo de um militante da UNE. 

E quanto mais essa geração se formava, os mais novos vinham confirmar. Eles elegeram Crepúsculo como seu símbolo. Mas eles não estavam apostando no amor sobre todas as barreiras. Eles previam sofrimento e corações devastados. O vampiro foi traído com um homem casado pela namorada entediada. E nós meio que já imaginávamos isso. O que é mais da nossa geração que uma criatura reclusa e sombria destruída de amor?

Minha geração procura motivos para cantar que o amor é uma charada cruel. Minha geração acha que querer morrer é amar de verdade. Que tudo era uma bagunça antes de “você” chegar e que depois só piorou. E, enquanto todos fingem que sua meta de vida é se sentir feliz, ter um bom emprego e posar de inteiro, os poetas do meu tempo estão sempre aos pedaços, imobilizados no chão frio.

E eu? Não posso mais fingir. Vou tirar o dia de folga do mundo. Vou deitar no chão e chorar. Vou fazer greve de fome. Vou beber cachaça até soluçar. Vou pedir pra me mudar, ir pra outro país, me isolar. Tentar te esquecer, tentar... Escrever textos melancólicos. Cultivar meu broken heart. E, se depois de narrar nossa história de amor e o desfecho dramático, alguém vier me perguntar o que eu vou fazer agora, a resposta não vai ser “seguir a vida”, “me ocupar” ou “procurar alguém melhor”. Vou fechar os olhos lentamente, respirar fundo, puxar a minha bolsa de qualquer jeito e começar a me arrastar em direção a minha casa...  Vou sofrer. Só isso.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Último tango na integração


Eu peguei um ônibus hoje. Isso não poderia ser o começo de uma história. E nem é. Está mais para o final. Peguei o ônibus e não conseguia parar de pensar: “estou de volta, estou sem carro, vou demorar mais de uma hora pra chegar...” Mas no meio disso tudo, o que estava presente mesmo era o medo. Medo de encarar tudo aquilo e ter certeza de que voltei e ter certeza que tudo tinha passado. Passou. A integração já não me serve de inspiração. Já não me traz a promessa de amigos por encontrar. Nem do meu antigo amor esperando para pegar o Recanto dos Vinhais. Olho para esse ônibus e tenho certeza de que tudo está perdido. As brigas bobas, o seu silêncio, a vontade dele de descer antes do ponto porque-era-mais-rápido, a sua chateação com a minha blusa, o fone de ouvido dividido, o nosso suor e agonia em um ônibus cheio, o nosso tédio, a nossa vontade de chegar. Essa integração lembra mais dele do que de todos os meus 17 anos antes da sua chegada. Lembra o meu coração partido ao vê-lo escolher outra parada. Mas, a cada dia que passa, esses sentimentos se desbotam, assim como os ônibus cujo vermelho vai ficando cada vez mais opaco. 

Esse não é mais o meu lugar. E talvez seja por isso que eu, logo eu, que sempre me gabei de ser uma busóloga não consigo mais fitar esses veículos sem me sentir estrangeira. Por um instante, dentro do ônibus, me senti de volta em São Paulo. Por um instante. Mas faltam portas. E sobra sujeira e barulho e uma sensação de que tudo é frouxo. As aparições e acontecimentos bizarros da integração não me encantam mais. E, no meio dessa tristeza boba, percebo que a vida era muito boa quando eu conseguia ser tão feliz que nem ligava pra esses ônibus. Hoje a felicidade não anda mais de ônibus. E nem de carro. Felicidade é um avião e um bilhete do metrô. Te encontro às três na linha verde, beleza?

sábado, 7 de julho de 2012

Jukebox


Saí de casa com a cabeça cheia. Decidi ir andando para a casa da minha amiga. Não importa quantas quadras, preciso andar. Tentava colocar as ideias no lugar, mas a única coisa que eu sabia é que não conseguia aguentar aquela aflição. Tinha que saber a verdade! Enquanto olhava distraída a rua, os carros e as lojas de antiguidade, ia ensaiando a nossa conversa que só aconteceria no outro dia.

Eu estava seminua, provavelmente depois de uma transa, aí eu respirava fundo e te olhava com a minha cara mais séria, a mesma que usava no metrô:

- Querido, você tem uma jukebox?
- O quê? – você se levantava e me olhava com cara de espanto.
- Quero saber se você tem uma jukebox... – fui diminuindo a voz enquanto o rosto corava.
- Por que você tá perguntando isso? – Disse e olhou para suas roupas e acessórios que estavam repousando no chão. – Você mexeu no meu tigre?
- Não! Claro que não! Eu não faria isso... É que eu dei uma olhada na sua penteadeira hoje e achei uns recados estranhos...
- Hum... Mas... Por que isso faz diferença?
- É que eu meio que gosto de você e queria passar mais tempo com você... Mas não sei se aguento ficar desse jeito se você continuar tendo jukeboxes...
- Mas eu pensei que não tínhamos exclusividade...
- Não temos, eu sei. Mas é que quando eu a vi lá, fiquei muito aflita. Sei como você é apaixonado por música e ela obviamente sabe bem mais que eu...

Não conseguia mais desenrolar o diálogo imaginário. Se ele confirmasse a suspeita, talvez eu perguntasse por que ele gostava de andar de casacos dados comigo. “Seu casaco é tão macio e feminino...”, ele poderia dizer.  E eu pensaria no trecho da música de Blackfield: Let your perfect fingers touch my skin... Então, talvez esquecesse a Jukebox, talvez eu o mandasse enfiar a Jukebox ruiva no c*, talvez continuasse andando pela Cardeal Arcoverde e saísse com o primeiro moço de boina e colete que passasse ao meu lado. Só amanhã saberei. Ou então...

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