quarta-feira, 29 de outubro de 2014

É preciso sentir dor: #nopainnogain

Como algumas pessoas mais próximas sabem, eu estou tentando mudar de vida. Mudar de vida no sentido de me tornar mais saudável, disposta e, de quebra, ficar com um corpo que eu ache legal. Antes de entrar na academia, eu já tinha tentado correr e, muito antes, já tinha me inscrito em aulas de Kickboxing. Na época, tudo isso me parecia muito divertido e motivador, já que além de me exercitar, eu ia aprender algo e isso, eu acreditava, me faria ser disciplinada. Não funcionou, mas, não por culpa das atividades e, sim, porque eu ainda não tinha realmente vontade de mudar de vida e desisti nas primeiras dificuldades.

Esse ano, resolvi, com muito incentivo das pessoas que me acompanhavam de perto, ir realmente atrás disso. Me inscrevi na academia porque era mais barato que muitas outras coisas mais divertidas e porque eu já tinha idade suficiente para parar de dizer que “academia é chato”. No meu primeiro dia de aula, meu instrutor quis me assustar. Montou aquele treino de perna matador e foi colocando os pesos nos aparelhos sem nem saber o que EU, que sempre fui sedentária, aguentava. Eu resisti o treino inteiro, reclamando muito. E voltei para casa com a perna toda falhando. Naquele momento, a única coisa que não me fez desistir foi pensar: “Ei, um dia eu vou fazer esse treino e não vou sentir vontade de morrer”.

Mas a verdade é que eu estava enganada. Não que eu não tenha me adaptado àquele primeiro treino, mas eu estava enganada quanto a lógica que estava circulando nas academias e em vários outros lugares. Porque essa lógica proíbe qualquer tipo de adaptação e costume. Segundo essa lógica, é preciso sentir dor.

Uma vez, um rapaz chegou mesmo ao ponto de me parar na academia e dizer que eu não estava forçando o suficiente. “Se tá fácil, é porque tá errado”, ele me garantiu. Aliás, essa frase também ilustrava uma campanha de tênis de corrida da Nike, que eu sempre olhava na USP. Se você segue alguém, em suas redes sociais, que tem uma vida “fitness” e aquele corpão escultural, você também vai encontrar em todas as postagens dessa pessoa esse tipo de “incentivo” ou filosofia de vida. Uma das que eu sigo, por exemplo, diz sempre que treina na carga máxima e que repete até a falha. Em um dos vídeos dela no instagram, é possível ouvir a voz do personal dizendo “sofre, sofre”.

E, tudo isso, ainda parece muito bizarro para mim. Mesmo depois de saber que a eficiência da musculação reside no fato de criar pequenas lesões no músculo (e, que, portanto, é impossível não sofrer), não acho que o culto à dor nos leve a algum lugar.

Venho de uma criação cristã (que cultiva, na base, ideia da doação e sacrifício) e sigo carreira acadêmica (que também, ainda que não explicitamente, pressupõe sacrifícios e um sofrimento aparentemente inescapável), e, portanto, posso dizer que já tive demais dessa lógica na minha vida. Hoje, no entanto, tento seguir os exemplos de amigos que passaram pelo mestrado como se tivesse sido um sonho, porque conseguiram ser disciplinados o suficiente para evitar o estresse de ter que dar conta de tudo nos 5 minutos do segundo tempo. E, não por coincidência, foi também um desses amigos (uma amiga que está com um corpão incrível, na verdade) que me mostrou que é possível praticar atividade física religiosamente sem cair nos excessos do culto à dor.


Como acredito que não conseguimos aguentar uma “situação-limite” por muito tempo, acredito que a ideia do #nopainnogain, ao mesmo tempo em que incentiva as pessoas mostrando que não é fácil para ninguém, também fornece uma perspectiva de vida assustadora. Não queremos sofrer para sempre, queremos enfrentar desafios, mas não para apenas enfrentar ainda mais desafios. Mas para chegar em um ponto em que nos tornamos melhores. Para mim, me tornar melhor diz mais respeito a enfrentar o desafio da disciplina diária do que a acatar discursos paranoicos. O meu ganho, não vem da dor.



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