segunda-feira, 27 de abril de 2015

Enquanto o like não vem


Ultimamente – por motivos de estresse e apreensão – tenho pensado muito em falha, em reprovação e rejeição. E, novamente, volto a pensar em como todas essas coisas podem estar intimamente ligadas com uma visão do mundo muito egocêntrica que biologicamente e socialmente parecemos ser impelidos a construir.

Não vou falar grego. Vou direto ao ponto. Sempre me amedrontou ou, antes, me envergonhou a minha incapacidade para lidar com reprovações. Em algum momento da vida, achei que tivesse aprendido da única maneira que se aprende, claro: sendo reprovada no que eu considerava ser um dos momentos mais decisivos da minha vida, me recompondo, tentando novamente e finalmente conseguindo a aprovação.

Mas aquele aprendizado aos poucos foi sendo apagado pelo novo fato de que agora eu tinha chegado onde eu queria e me considerava uma pessoa um pouco melhor depois da experiência. No entanto, comecei a pensar sobre algumas pequenas provações do dia a dia e percebi que as reprovações acontecem todos os dias. E elas não consistem sempre em resultados de processos seletivos. Elas estão, com frequência, nas opiniões das pessoas com quem você se relaciona e nos feedbacks de algo que você fez/produziu.

E sempre me deixou estarrecida o peso que um comentário negativo sobre um texto meu assumia. Ou uma omissão e uns likes que não vieram. Não estava bom? Não conseguiram entender a minha proposta? A proposta não estava clara ou o problema era com o lado de lá? Não tinha escolhido a palavra ou o filtro certo? Não era uma boa foto? Talvez eu não devesse ter falado sobre isso? Muito superficial? Muito equivocada? Muito pedante?

Por mais que eu ache essa ideia ridícula, percebi que intimamente eu estava sempre esperando por um reconhecimento, uma aprovação das minhas atitudes e das minhas ideias. Algumas aprovações, claro, pesavam mais na balança. Mas, em um mundo virtualmente partilhado e agigantado, a aprovação quantitativa também fazia muita diferença.

É óbvio que tudo isso estava muito ou completamente relacionado com uma forte insegurança (no meu caso). Mas admitir isso e apenas julgar que eu estava bem e a vida seguia sem que eu tivesse que dar ouvidos para algumas críticas bem pesadas não parecia me levar a nada. Sempre tentei levar em consideração o que me diziam, especialmente, se era algo negativo. Por mais que nem sempre tenha conseguido tirar um ensinamento disso (às vezes não tem ensinamento nenhum por trás mesmo), posso garantir que engoli a decepção que batia no peito e tentei olhar muitas críticas com um olhar menos defensivo ou contrariado.

Mas até isso não era aprender a lidar com as reprovações. Era apenas aceitar que eu nunca seria aprovada por todo mundo que estava ao meu redor e, principalmente, era tentar me confortar com o pensamento de que algumas dessas reprovações poderiam me levar a ser uma pessoa/profissional melhor. Mas essa compreensão de “ser uma pessoa melhor” era em geral a ideia de que eu poderia algum dia chegar a um reconhecimento unânime e inquestionável. Entretanto, hoje acho que “aprender a lidar” com as reprovações e as rejeições é justamente abrir mão dessa ideia tão sólida do “eu”, é tentar não me pensar como tão distinta de todo o resto.

Mas como deixar de pensar a partir desse eu? Eu não sei. Essa é a resposta que eu procuro. Alguns dizem empatia. Por que tentar se colocar no lugar dos outros pode nos ajudar a destruir algumas barreiras egocêntricas. A resposta também pode estar em uma expressão bonita do escritor Alex Castro: “praticar a não-opinião”. Isto é, tomar cuidado com os juízos que você faz, com as certezas que você leva, especialmente, com a certeza de que você sabe alguma coisa.

Gosto de todas essas propostas. Mas tenho me apegado bastante a uma, que li em um livro de zen budismo (SIM! HAHA), e me veio na cabeça depois de ter lido um texto do Chez Noelle sobre o mundo da moda e como às vezes é preciso apenas se lembrar de que ter chegado a um lugar muito desejado não torna você melhor, não te distingue dos outros. A proposta é o reverenciar, se prostrar.

Se prostrar diante de quê? De tudo. Se prostrar não parece com se humilhar? Não. Diz respeito a quebrar a barreira que cria uma distinção, que separa você de qualquer outro ser existente. Confesso que, às vezes, tenho medo disso ser uma impossibilidade. Mas, como exercício eventual, ele já traz um grande conforto. Quando as coisas se avolumam – chegam as críticas a sua pesquisa, a pessoa com quem você quer sair não parece interessada em você ou ninguém parece se interessar realmente por você, alguém na internet é absolutamente cruel em um comentário contra você – você simplesmente respira fundo e lembra que o mundo não é sobre você. Ele não começou a girar no momento que você abriu os olhos ao amanhecer. Você é parte daquilo. 

Só mais uma parte.


Eu sou água! Eu sou água!


A foto que hoje ilustra essa postagem é um presente da Bárbara Carneiro, que sempre me mata de amores com as fotos (e os textos!) cheias de amor dela.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Memórias do minhocão (I)

A primeira pessoa que me falou do minhocão foi ela. Até então ele era só meu vizinho, mas eu não sabia que existia essa possibilidade de conhecê-lo, nem que pudesse ter algo de interessante naquele rio de concreto cuja mata ciliar era toda composta de prédios desvalorizados.

Ela é desse tipo de turista nato, a Mari. Meus amigos maranhenses (e eu), quando vinham pra São Paulo, visitavam o Ibirapuera, a Pinacoteca ou o CCBB. Mas ela veio para visitar os amigos, dormir na minha casa sem móveis, conhecer um cachorro celebridade da internet e, se desse, passear pelo minhocão.

Não lembro se ela foi. Se foi, não foi comigo. Mas foi ela quem me deixou curiosa sobre o lugar. Talvez por isso, sempre acabo lembrando dela e pensando em como seria gostoso correr com ela lá.

***

Eu vi um incêndio.
 
Decidi voltar da casa dele andando. Com a mesma roupa da noite anterior. Com a bolsa pesada que eu odiava mas não conseguia aposentar. Com um sorriso nos lábios. E um olhar cheio de brilho que eu queria usar para redescobrir os detalhes do minhocão...

Algumas pessoas estavam reunidas em um ponto olhando pra algo no exterior. Não lembro em que ponto, mas devia ser na altura do metrô Santa Cecília. Achei que poderia ser uma intervenção artística, mas todos pareciam preocupados. Cogitei que mais um cachorro teria sido quase atropelado por algum ciclista. Olhei ao redor e até tinha um cachorro e um ciclista no grupo, mas ninguém olhava pra eles. Quando me aproximei, vi que o que impressionava a todos era o incêndio. 
 
Também me impressionei. Faz muito tempo que a gente não vê coisa assim. Parei e tirei uma foto pra enviar para ele.

Da última vez que fui lá, passei pelo lugar do incêndio e fiquei pensando se houve algo que deixei passar. Se o fogo ou a fumaça tentaram me dizer algo sobre as duas semanas que se seguiram. Sobre o incêndio que ele veria e me mandaria em fotos. Sobre tudo que se perde no fogo...

***

Talvez não seja o minhocão. Talvez sejam as pessoas. É gostoso quando ele está mais vazio, mas quando ele está cheio de gente correndo, conversando, fazendo churrasco e comendo em foodtruck (sim!), é que me dou conta de que a ocupação da cidade é a melhor ideia do mundo. A cidade é pra gente!

Acho que foi isso que senti na primeira vez que caminhei por lá. Acho que é por isso que sempre quero voltar.

***

Caminhar pelo minhocão é bom. Correr no minhocão é melhor. Quando eu corro, esqueço de pensar. Na verdade, tenho que ficar tão concentrada repetindo mentalmente "respira pelo nariz, solta pela boca", que esqueço de pensar em outras coisas.

Vou passando pelas pessoas e reparando do que dá entre o inspirar pelo nariz e expirar pela boca. Às vezes, flagro um casal em algum momento que o sentimento extrapolou. Ou vejo crianças quase caindo em seus patins e skates. E cachorros se aproveitando da desatenção dos donos. São momentos em que o tempo para. Tenho vontade de sorrir e nem preciso respirar.

Às vezes, o mantra aeróbico é substituído por pensamentos que surgem pequenos e vão se alargando até adquirir um peso desesperador. Tudo fica grave. Me sinto sufocar. Então percebo que apenas esqueci de respirar. Tudo volta ao seu lugar.

Não sei fazer duas coisas ao mesmo tempo.

***

Uma vez, levei três amigos pro minhocão. Eu não tinha plano. Achei que quando chegasse lá, eles iam sacar essa sensação louca que eu sinto. Eles não queriam caminhar. Um deles me perguntou para onde a gente estava indo. Fiquei desconcertada. O minhocão não é sobre destinos e chegadas. Ainda assim, prosseguimos um pouco mais.

Um deles era super calado. Não sei dizer se sentiu o que eu sentia, mas ele foi andando na frente até se separar bastante do grupo. Sumiu. Quando voltou, explicou que só quis ir até o fim.

Eu achava que o minhocão não tinha fim.
 
 
 

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Meu Facebook ainda lembra de você

Sempre achei que a sua presença constante no meu Facebook se devia às inúmeras vezes em que visitei o seu perfil para ver se não tinha algo novo, algo sobre mim. Mas, ontem, mais de um ano depois da última vez que trocamos qualquer palavra, comecei a digitar um nome na busca e a sua imagem novamente apareceu nas sugestões.

Antes, eu costumava reparar nisso com frequência e achar graça. Testava digitar a primeira letra do teu nome, só para ver se você era a primeira sugestão. Era. Testava, então, a primeira letra dos teus sobrenomes e depois apenas qualquer letra do teu nome, e sempre tinha você como primeiro resultado. Mas fazia um ano que o seu chat não registrava nenhuma mensagem nova. E um ano que o teu feed era bloqueado. Mais de um ano que não havia interação por curtidas e comentários. Um ano que eu tinha me acostumado a te esquecer.

Eu tinha uma teoria de que o Facebook "previa" as pessoas por quem a gente se apaixonava. Lembro que, certa vez, me interessei por um rapaz com quem só conversava na faculdade, nunca no chat da rede social. Mas, sem que eu escolhesse nenhuma preferência, ele aparecia na minha página. A fotinho dele sempre aparecia quando eu visualizava o meu perfil, na seção de amigos. E o Facebook gostava de me dar o doloroso aviso de que a bolinha dele estava verde, mas não era comigo com quem ele estava conversando às 2h da manhã.

Mas no seu caso, não havia nada de misterioso. O Facebook devia saber que, quando estávamos nos conhecendo, eu visitava seu perfil e lia todas as suas postagens, só não sabia que eu morria de vontade de curtir. Devia saber, também, que eu meio que conhecia todas as suas fotos e tinha salvado a minha preferida. Ou o Facebook podia ter simplesmente contabilizado a quantidade de vezes que te chamei no chat.

O que não dava para explicar era essa insistência depois de mais de um ano sem registros. Esse algoritmo não apagava o passado? Porque ele lembrava do quanto eu gostei de você, mas não lembrava de todas as mensagens que mandei e ficaram sem resposta? Por que ele não lembrava que nunca era você que me procurava? Porque ele não lembrava que você nunca curtia minhas fotos e minhas postagens? Porque ele não podia esquecer todas as tolices e esforços que eu fiz por você?

Senti raiva do Facebook! Porque ele era tão burro? Porque ele insistia no que não tinha futuro?

Então, me peguei imaginando o quê o Facebook não saberia de você. Diverti-me com a ideia de imaginar um algoritmo que quisesse dar uma segunda chance para nós dois. Que achasse que tínhamos enfiado os pés pelas mãos. Um algoritmo que ainda visse alguma esperança em simplesmente não termos deletado e bloqueado um ao outro. Até que seria bonito escrever sobre esse amor de Facebook. Talvez fosse algo que você finalmente curtisse.
.
Por outro lado, talvez, houvesse algo de mais prático nesse algoritmo de memória eterna. Talvez fosse preciso me lembrar do que eu fiz. Criar um algoritmo irônico para me fazer repensar. Tirar uma onda. Desses investimentos que a gente faz. E se pega refazendo. Ou querendo refazer.

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