domingo, 13 de fevereiro de 2011

Crescer



Quando ele nasceu, o ninho até esquentou um pouco mais. Não só pela época do ano e pelo avançar da manhã, mas pelos pios animados de sua mãe, que exalava um hálito quente cheio de contentação. Quando o olhou no meio dos outros passarinhos que haviam rachado seus ovos primeiros apenas parou feliz antecipando o futuro do seu mais novo passarinho. Decerto, ela sentiu que havia algo de diferente neste passarinho bonito e esbelto, mesmo que por fora se parecesse bastante com os demais.

Na primeira lição de vôo, depois de um resgate desesperado, todos descobriram que ele, desafortunado, era um passarinho de vidro. Após esse dia, seu lar e prisão foi o alto do penhasco onde havia olhado pela primeira vez o azul e a luz. Quando a mãe saía para caçar sua comida, sozinho, contemplava o penhasco questionando para algum Deus que acaso estivesse ali acorrentado qual era o propósito da vida de um passarinho de vidro em cima de um grande penhasco. Não havia missão, não havia tarefa, não haveria habilidades... não haveria sentido para a vida. Esperou uma resposta, mas a cada vez que ela tardava, o vento assobiava um convite do penhasco para pôr fim à tão irônica existência.

Resistiu sem saber por quê. Do penhasco apenas imaginava a velhice: tão solitária e vazia quanto toda a sua vida. Até que um dia, um tremor de terra perpassou seu abrigo. Um tremor inesperado que abalou a única certeza do passarinho de vidro, a da segurança daquela rocha. O evento não foi o suficiente para estremecer toda a montanha, mas uma única pedra, de tamanho pequeno, dessas que serviriam para atirar em um rio e fazer quicar até o horizonte, se soltou da rocha e rolou em direção ao ingênuo passarinho.

Ele sentiu que era o seu fim e já estava semi inconsciente quando o barulho de vidro quebrado ressoou pelo penhasco. Um impacto.

Depois de algumas horas de extrema dor, ele se acalmou. “Como ainda poderia estar sentido dor?” olhava os cacos a sua volta e se perguntava. “Como sequer posso estar olhando os pedaços de mim?”. Nada fazia sentido. Tentou se olhar, mas não conseguia. Quando o sol começou a se pôr, os caquinhos no chão começaram a refletir o que ainda restara dele. Um grande pedaço de vidro, sem uma das asas, sem pernas, com o coração trincado, mas vivo.

“Estou vivo”, piou e sentiu o corpo se fortalecer um pouco. Talvez fosse felicidade. Felicidade de viver. Durante dias juntou seus caquinhos. Não era fácil, estavam espalhados e os pedaços nem sempre pareciam querer voltar para o mesmo lugar. Ficou pronto, meio remendado, mas feliz. E tinha uma resolução: sair dali. A rocha que antes representava a sua longa vida vazia, hoje representava o perigo para a vida que só queria ser vivida.

Encarou o penhasco, receoso. Não olhou para baixo, olhou para o céu, que agora lhe fazia seu convite. Jogou-se. Sentiu a brisa batendo no rosto e no peito antes de começar a cair. Caiu, caiu e continuava afundando. Mas não se desesperava. Balançava as asas e procurava sumir alguns metros. Olhava para a asinha de vidro remendada rezando para que o ajudasse a viver. Foi quando viu uma pequena folhinha engatada entre as rachaduras da asa. E não era só uma. Cada vez mais apareciam folhinhas brancas e... “Será que... será que são penas?”. Começou a bater as asas com mais firmeza, da forma como viu sua mãe recomendar. Bateu, bateu, mas já estava desistindo quando percebeu que podia ver agora o local onde passara toda sua vida.

Do alto.

Mirou a pedra e deu a meia-volta rumo ao horizonte.

Um comentário:

Anônimo disse...

Heyyy... que bacana blog novo! Adorei viu, textos bacanas e layout fofo! Bjos passa lá no blog!

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